quarta-feira, 7 de outubro de 2009

La Negra vive!

Railídia Carvalho*


Não lembro quando comecei a ouvir os discos da cantora argentina Mercedes Sosa. Sei que estava em Belém e recordo que o impacto foi tremendo como ainda é hoje quando a ouço: canto sem artifícios, emocionado, intenso, cheio de atmosferas. Foi um encanto pra mim que sempre sonhei com a felicidade plena. E creio nesta felicidade até hoje. Agora também sei que ela chega aos poucos e nem sempre se manifesta completamente.

Ouvir o canto e a fala da Mercedes Sosa sempre foi um momento, inédito, de felicidade completa. Canción con todos (Armando Tejada Gómez Y César Isella) em que todas as mãos e vozes estão juntos, unidos pela América; Duerme Negrito (recolhida por Atahualpa Yupanqui) que foi durante muito tempo uma canção que muito me acompanhou e sempre volto a ela:

"Duerme, duerme, Negrito
que tu mamá está en el campo, Negrito...
Trabajando, trabajando duramente
Trabajando si, trabajando y no le pagan...”

Ouvimos tanto falar da integração da América, mas Mercedes entregou sua vida à construção dessa nação unificada, dos irmãos americanos, da nossa américa querida, amada. Há pouco tempo, a convite da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, cantei para muitos americanos e brasileiros Canción con Todos. Cantei com amor, sentimento, senso de justiça e integração. Essa foi a escola da Mercedes, artista esplêndida, humanista e consciente de que nesta vida a solidariedade e a generosidade são imprescindíveis.

Mercedes sonhou, viveu e pagou por este mundo defendido por ela. Quanto estamos dispostos a pagar? “La Negra” partiu neste domingo. Ficamos nós, sonhando e removendo pedras do caminho.


Railídia Carvalho é cantora e jornalista